domingo, 25 de outubro de 2009

DACILITO: O último adeus

O saudoso Dacilito no sítio histórico-arqueológico das ruínas do casarão do Barão de Aymorés (Casarão dos Escravos) na localidade de Serra de Baixo, zona rural de Nova Venécia, tendo ao fundo a Pedra do Elefante. Flagrante dos bastidores de entrevista dada por Dacilito a repórter da Star TV, Gabriella Coppo, sobre sua participação no longa metragem do diretor Paulo Thiago, SAGARANA: O DUELO, que teve uma de suas seqüências gravadas neste local em 1973. Foto: Rogério Frigerio Piva, 16/04/2009.

Infelizmente, conhecemos muito pouco o Sr. DACÍLIO JÚNIOR PESTANA SANTOS (1945-2009), chamado por todos, carinhosamente, de DACILITO. Nosso primeiro e único contato foi apenas em uma tarde, na qual travamos intensa conversa. Em meio as filmagens de uma entrevista para a Star TV, pude conhecer melhor aquele homem, sobre o qual, já ouvira muitas histórias, e perceber que estava diante de um grande veneciano como poucos que ainda temos hoje em dia.
Filho de tradicional família veneciana, Dacilito, orgulhava-se muito de seu saudoso pai, Sr. Dacílio Duarte Santos. Seu pai foi um dos homens que liderou a emancipação política do distrito de Nova Venécia no ano de 1953, quando era vereador, pelo distrito, na câmara municipal de São Mateus. Como Dacilito fazia questão de contar, naquele tempo, o seu pai saiu em lombo de cavalo pelos arrastões de madeira (caminhos) que levavam ao interior para colher, de casa em casa, as assinaturas do abaixo-assinado que endossava o processo de emancipação de Nova Venécia.
Creio que um dos fatos mais marcantes relacionado ao Dacilito seja o seu envolvimento com a produção do longa metragem SAGARANA: O DUELO do cineastra Paulo Thiago. Gravado em 1973, teve sua primeira seqüência rodada nas ruínas do casarão do Barão de Aymorés (Casarão dos Escravos), na localidade de Serra de Baixo, zona rural de Nova Venécia.
Segundo Dacilito, os tiros ouvidos na seqüência foram feitos por ele, visto que o protagonista, o ator Joel Barcelos, não possuía intimidade com as armas. Estas, aliás, eram do acervo de Dacilito e foram utilizadas na produção da película que se tornou um clássico do cinema nacional. Aliás, a coleção de armas de Dacilito era famosa e merecia ser preservada de maneira permanente em um museu na cidade em que ele nasceu e amava. Segundo se noticiou, estas, estão em segurança, sob guarda do exército em Vila Velha, a espera de alguma iniciativa que as traga de volta para nossa cidade.
Inclusive, ainda sobre o filme SAGARANA, contava Dacilito que o "calhambeque" utilizado no filme, era de Flayne Bastos e teria sido reformado exclusivamente para este propósito.
Mais detalhes sobre o filme:
E foi com imensa surpresa, ou melhor, espanto, que recebemos a notícia da morte de nosso amigo Dacilito e, a ele e a sua jovem filha, dedicamos estas linhas que, se não foram escritas antes, foi por ainda sentirmos o engasgo na garganta do que poderia ter sido uma longa e duradoura amizade.

O cinegrafista, a repórter da Star TV, Gabriella Coppo, e Dacilito. Flagrante dos bastidores de entrevista dada por Dacilito a repórter da Star TV sobre sua participação no longa metragem do diretor Paulo Thiago, SAGARANA: O DUELO, que teve uma de suas seqüências gravadas na Serra de Baixo, zona rural de Nova Venécia em 1973. Foto: Rogério Frigerio Piva, 16/04/2009.
Detalhes sobre o acidente que, na manhã do sábado, dia 26/09/2009, tirou a vida de Dacilito e sua jovem filha:
http://anoticianv.com.br//index.php?option=com_content&task=view&id=266&Itemid=41

Epitáfio para um amigo......

Sentinela
Milton Nascimento
Composição: Milton Nascimento / Fernando Brant


Morte vela sentinela sou do corpo desse meu irmão que já se vai
Revejo nessa hora tudo que ocorreu, memória não morrerá
Vul.......to negro em meu rumo vem
Mostrar a sua dor plantada nesse chão
Seu rosto brilha em reza, brilha em faca e flor
Histórias vem me contar
Longe, longe, ouço essa voz
Que o tempo não vai levar
Precisa gritar sua força ê irmão, sobreviver
A morte inda não vai chegar, se a gente na hora de unir
Os caminhos num só, não fugir e nem se desviar
Precisa amar sua amiga, ê irmão e relembrar
Que o mundo só vai se curvar
Quando o amor que em seu corpo já nasceu
Liberdade buscar,
Na mulher que você encontrar
Morte vela sentinela sou
Do corpo desse meu irmão que já se foi
Revejo nessa hora tudo que aprendi, memória não morrerá
Longe, longe, ouço essa voz
Que o tempo não vai levar

sábado, 10 de outubro de 2009

08 de Outubro: Mangueira da Rua Salvador Cardoso completa 94 anos

Plantado no dia 08 de Outubro de 1915, após as 09:00 horas da manhã, em frente a residência e comércio do Sr. Salvador Cardoso, na então vila de Nova Venécia, para homenagear o nascimento de seu filho Romeu Cardoso, após 94 anos, o pé de manga côco permanece belo e frondoso, porém, sofre com a negligência da população e da administração municipal.


Detalhe da “mangueira” da Rua Salvador Cardoso com o “posto” de coleta de lixo bem ao lado de seu tronco quase centenário, tendo ao fundo a secular residência de Salvador Cardoso. A foto é de fevereiro de 2009, porém a imagem permaneceu a mesma até o último domingo (04/10/2009) quando estivemos no local e constatamos que infelizmente nada mudou. Foto: Rogério Frigerio Piva, 19/02/2009.


Por Rogério Frigerio Piva


Seria uma data para ser comemorada, mas sequer foi lembrada pela administração municipal de Nova Venécia. A árvore “Mangueira” da Rua Salvador Cardoso, no centro da cidade de Nova Venécia, se aproxima dos cem anos e praticamente viu a cidade de Nova Venécia nascer, pois, quando foi plantada, ainda não havia sequer o traçado das ruas do centro da cidade, que foi oficializado somente 20 anos depois, em 1935.

A tradição oral das antigas famílias venecianas: Cardoso e Toscano, registram que o plantio da árvore naquele local está relacionado ao nascimento do filho de Salvador Cardoso, chamado Romeu Cardoso [leia transcrição do termo de nascimento de Romeu Cardoso no anexo, ao final desta postagem], em 08 de Outubro de 1915, às 09:00 horas da manhã, na residência de Salvador, esta, milagrosamente ainda existente em frente ao belo pé de manga.
Vista da Rua Salvador Cardoso, no centro da cidade de Nova Venécia, quando ainda se chamava Rua João Pessoa, em 1957, somente no ano seguinte ela foi rebatizada com o nome atual. A quase centenária mangueira ao centro do logradouro, que neste tempo, ainda não possuía pavimentação, mas ostentava todo seu casario. É a rua mais antiga de Nova Venécia, onde ainda existe a casa mais antiga do centro da cidade que pertenceu àquele que hoje dá nome à mesma. Fonte: Enciclopédia dos Municípios Brasileiros, vol. XXII, IBGE, 1959.


Em 15 de Julho de 1988, há 21 anos atrás, um Decreto Municipal de nº 1.302 assinado pelo ex-prefeito Adelson Antônio Salvador, declarou a mangueira “imune de corte” sacramentando assim o seu tombamento a nível municipal. Portanto, Nova Venécia deveria se orgulhar de, em pleno século XXI, possuir, no centro de uma rua, em pleno centro da cidade, uma árvore quase centenária. Inclusive, desconhecemos, pelo menos no nosso estado, outro município que possua uma árvore tombada - protegida - nessas condições.

Apesar de tudo que já foi dito, esse patrimônio natural de Nova Venécia sofre com a negligência da população e da administração municipal. Desde o ano passado, já havíamos alertado, aqui mesmo em nosso blog, para o fato da árvore estar sendo utilizada como posto de coleta de lixo na Rua Salvador Cardoso, fato comum em muitas ruas venecianas, pois a população insiste em colocar fora do horário de coleta, os seus detritos, que muitas vezes acabam por imundiçar as vias venecianas. No caso da mangueira há até uma “oficialização” da administração municipal que, desde a gestão anterior mantém um latão de lixo em frente à mesma.

Mas o problema não pára somente no lixo. Não existe no local, sequer uma placa de sinalização identificando que a árvore é protegida de corte por legislação municipal e informando a sua importância cultural para a História de Nova Venécia. O que deveria ser uma referência “turística” sequer é citado no site oficial da prefeitura. É como se ela não existisse.

Em outra ocasião, já sugerimos, aqui em nosso blog, que deveria ser feita uma remodelação no canteiro que está no entorno da mangueira para valorizar a beleza cênica da rua em conjunto com o casario do início do século XX. Queremos acreditar que, infelizmente, ninguém da administração leu nosso apelo, feito ainda no ano passado [veja os links no final da postagem].

A “mangueira” fica próxima a outro patrimônio de Nova Venécia, a Igreja Matriz de São Marcos. São patrimônios, natural e cultural, que devem ser pensados em conjunto no que diz respeito ao paisagismo. Ambos são símbolos da identidade do povo veneciano e pontos turísticos de nossa cidade. Foto: Rogério Frigerio Piva, 19/02/2009.

Povos antigos, como o celta, acreditavam que uma árvore é, com suas raízes profundas na terra e seus galhos erguendo-se para o céu, uma ligação entre o céu e a terra. Um símbolo incontestável da vida. E não precisamos ir longe, aqui mesmo, o povo botocudo, que habitou por séculos estas terras, dava tanta importância às árvores que acreditava que um “inferno” seria um lugar sem árvores onde o sol queimaria constantemente suas faces. A própria mangueira, segundo a já citada tradição oral, teria servido de local de repouso para os últimos grupos indígenas que existiram em nossa região, quando passavam pela nascente povoação.

Também chamamos atenção para o fato de que, apesar de não ser nativa do Brasil, a manga é abundante em nossa região, em especial no nosso município, podendo ser destacada como uma fruta típica de Nova Venécia.

Acreditamos que deve ser feito um trabalho em conjunto de manutenção, valorização-conscientização e divulgação envolvendo as secretarias municipais de Obras, dos Transportes e Urbanismo; a novíssima Secretaria de Meio Ambiente; bem como as secretarias de Cultura e Turismo e a de Educação.

Numa época em que a preservação ambiental está em destaque rogamos à administração municipal e aos cidadãos venecianos que valorizem e acolham com carinho a NOSSA mangueira um símbolo de vida e um verdadeiro MONUMENTO à memória dos índios que foram literalmente “engolidos” pelo processo de colonização que deu origem ao nosso município. E que venham os cem anos!!!


Anexo

TERMO DE NASCIMENTO de Romeu Cardozo
Transcrito do Livro Nº 03-A de Nascimentos sob nº 1.259 às folhas 122 do Cartório de Registro Civil e Tabelionato da Sede do Município de Nova Venécia (ES) por Rogério Frigerio Piva em 08/09/2009.


[folha 122] Numº 1259 Aos nove dias do mez de Outubro do an- / no de mil novecentos e quinze, neste / segundo districto do Juizo Districtal / do Municipio de São Matheus Estado / Federado do Espírito Santo, compareceu / em meu cartório Salvador Cardozo / e em presença das testemunhas abai- / xo nomeadas e assignadas decla- / rou: Que no dia oito do corrente / mez no lugar denominado – Nova - / Venezia – e casa de sua residencia / ás nove horas nasceu uma crian- / ça do sexo mascolino a qual deu-se / o nome de Romeu Cardozo, filho / legitimo dêlle declarante e D. Felin- / tha Cardozo, naturaes deste Muni- / cipio e residentes neste districto.
Avós paternos José Antonio Cardozo e / D. Liocadia de Almeida Cardozo e ma- / ternos, Ignacio Maciel Toscano e D. Ro- / mana Toscano. Do que para constar / lavrei este termo em que comigo as- / signa o declarante e as testemunhas / Eleosippo Rodrigues da Cunha e / Manoel Antonio da Silva, este lavra- / dor e aquelle negociante residentes / neste districto. Eu Ernesto Ayres Fa- / ria escrivão interino do Juizo Distri- / ctal o escrevi.


[assinaturas] Ernesto Ayres Faria
Salvador Cardozo

Manoel Antonio da Silva.



Para saber mais veja também:

* A Mangueira da Rua Salvador Cardoso , postagem de 25/08/2008

* Decreto Municipal Nº 1.302 de 15/07/1988. Declara imune de corte a "Mangueira" localizada no centro da Rua Salvador Cardoso , postagem de 21/02/2009.

ATENÇÃO!!!

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