terça-feira, 25 de agosto de 2009

Mestre de Folia de Reis de Nova Venécia é premiado na Edição 2009 do Prêmio “MESTRE ARMOJO DO FOLCLORE CAPIXABA”


Mestre Anízio, aqui ostentando traje típico, foi reconhecido pelo seu trabalho de dedicação com o Grupo de Folia de Reis “Sois Reis”, recebendo o Prêmio de 10 mil reais, constante do Edital 13 da Secretaria de Estado da Cultura – Secult, intitulado “Mestre Armojo do Folclore Capixaba”. Foto: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Nova Venécia, 2009.


A Cultura do Norte do Espírito Santo e, em especial, o nosso município de Nova Venécia, tem muito a festejar pela premiação recebida pelo “Mestre Anízio” do Grupo de Folia de Reis “Sois Reis”, grupo este, que vem atuando desde 2001 em Nova Venécia.
Sobre a Folia de Reis, manifestação folclórica que faz parte do Patrimônio Cultural (Imaterial) Veneciano, há testemunhos de que é realizada desde o início do século XX no território do nosso município. E, seguramente, merece todo apoio e atenção por parte do governo municipal para sua preservação/perpetuação. Agora que o esforço de décadas foi reconhecido pelo governo do Estado, avista-se o maior desafio: fazer os nossos jovens identificarem a Folia de Reis como sua herança cultural, para que esta tradição não se apague com o tempo.

Segue abaixo, a íntegra da notícia vinculada, no último dia 20, no site da Prefeitura Municipal:

Prêmio de R$ 10 mil para Mestre da Folia de Reis de Nova Venécia

Assessoria de Comunicação – Através do Projeto Editais da Cultura, lançado pelo Governo do Estado, por meio da Secretaria da Cultura (Secult), em março deste ano, o Mestre de Folia de Reis de Nova Venécia, Anízio Antônio da Silva, 62, acaba de faturar R$ 10 mil como prêmio pelas ações em prol da cultura em pelo menos 28 anos de sua vida.

O veneciano foi o único artista da Folia de Reis contemplado no Norte do Estado, em meio a 200 concorrentes. O titulo faz parte do concurso específico da Folia de Reis, intitulado Mestre Armojo do Folclore Capixaba.

Em Nova Venécia a cultura é tratada com prioridade pela Secretaria de Cultura e Turismo. O Mestre premiado faz parte do grupo Sois Reis, que desde 2001 se apresenta em escolas e municípios da região.

Após a conquista, a intenção do Secretário de Cultura de Nova Venécia, Otamir Carloni é promover uma noite de folclore no Centro Cultural Casarão. “Além disso, vamos tentar fixar o senhor Anízio nos quadros efetivos da cultura veneciana, com o intuito de fortalecer os grupos mirins e resgatar os jovens para a Folia de Reis veneciana”, declara Carloni.

Valorização – O prêmio recebido pela Folia de Reis veneciana faz parte do projeto Editais da Cultura, lançado com 18 Editais de Incentivo à Cultura, que premia artistas de todo o Estado em vários vértices.

O objetivo é incentivar a formação e fomentar a criação, a produção e a distribuição de produtos e serviços que usem o conhecimento, a criatividade e o capital intelectual como principais recursos produtivos, e tornar a atividade cultural uma importante estratégia nos programas de desenvolvimento capixaba.



O Coordenador Cultural Oscar Ferreira, Mestre Anízio e o Secretário de Cultura e Turismo de Nova Venécia Otamir Carloni. O governo municipal está de parabéns por apoiar uma das mais tradicionais manifestações folclóricas de Nova Venécia. Torcemos para que esta "parceria" continue dando frutos e que a população veneciana se identifique e reconheça a Folia de Reis como parte de sua herança cultural. Foto: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Nova Venécia, 2009.


Fonte: “Prêmio de R$ 10 mil para Mestre da Folia de Reis de Nova Venécia” disponível em http://www.novavenecia.es.gov.br/banco/noticias.php?id=236 , acessado em 25/08/2009. Sobre o Prêmio veja também “Secult publica resultado de mais três editais de incentivo à cultura” disponível em http://www.secult.es.gov.br/?id=/noticias/materia.php&cd_matia=1175 , acessado em 25/08/2009.

Quem foi “Mestre Armojo” ou “Hermógenes Lima Fonseca” (1916-1996)?*
O folclorista, historiador e escritor Hermógenes Lima Fonseca, natural de Conceição da Barra, Espírito Santo, foi uma das maiores autoridades na cultura e nos costumes populares capixabas.
Presidente da Comissão Espírito-Santense de Folclore, membro da Academia Espírito Santense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, Hermógenes é autor de inúmeras obras sobre o folclore capixaba e o povo da região.

*Fonte: “O folclore do Espírito Santo” disponível em http://www.aracruz.com.br/show_cmd.do?act=stcNews&menu=false&id=1523&lang=1 , acessado em 25/08/2009.


O Ticumbi, as Bandas de Congo, o Alardo, o Reis de Boi, a Folia de Reis, foram folguedos pesquisados pelo saudoso “Mestre Armojo” e, magistralmente, apresentados no seu livro “Tradições Populares no Espírito Santo” publicado, em 1991, pelo extinto Departamento Estadual de Cultura, do qual extraímos alguns trechos:

[A Significação dos folguedos folclóricos no Espírito Santo]**

Por Hermógenes Lima Fonseca (Mestre Armojo)

(...)
Esses folguedos são autos litúrgicos profanos, ligados aos festejos religiosos católicos, remontam a séculos. Atualmente apenas em alguns lugares são toleradas pela igreja, que ignora a sua origem e sua importância na demonstração da crença popular, uma forma da manifestação da fé que tem o povo aos seus santos protetores.
(...)
O expontaneismo de suas criações é a característica principal quando se observa com acuidade a música que cantam, a coreografia e a letra dos cantos.
É o teatro do povo no ambiente em que vive, a céu aberto, nas ruas ou em suas casinhas apertadas para se divertirem e ao povinho que assiste, prestigiando e valorizando esses numerosos grupos existentes por todos os cantos do Espírito Santo.

**Fonte: “Folclore do ES” – “A Significação” disponível em http://www.seculodiario.com/folclore/tradicoes/index3.htm acessado em 25/08/2009. O texto pertence à obra: FONSECA, Hermógenes Lima. Tradições populares no Espírito Santo. Vitória: Depto. Estadual de Cultura, Divisão de Memória, 1991.

sábado, 15 de agosto de 2009

101 Anos de São Roque do Pip-Nuk (1908-2009): A religiosidade popular no Canaã Veneciano

Capela de São Roque do Pip-Nuk em dia de festa no mês de agosto. A arquitetura simples da 4ª e atual capela, edificada em devoção a São Roque no Pip-nuk, sempre guardada pelo sino adquirido pelos MILLERI em 1909, há exatos cem anos atrás. Foto: Rogério Frigerio Piva, 1998.


Por Rogério Frigerio Piva*

No estado do Espírito Santo a devoção ao santo francês, nascido em Montpellier, na França, no ano de 1295 e cujo nome é Roque, possui muita popularidade, principalmente nos núcleos de colonização italiana. A sua festa é celebrada pela Igreja Católica no dia 16 de Agosto, época em que várias comunidades do interior promovem suas tradicionais festividades.
Existe no nosso estado, um município que possui seu nome. É São Roque do Canaã, emancipado a alguns anos do antigo município de Santa Teresa. Em nossa região, próximo à Nova Venécia, no município de São Gabriel da Palha, temos o povoado de São Roque da Terra Roxa. Cito apenas estes para exemplificar minha afirmação.

Em Nova Venécia os imigrantes também cultivaram essa devoção ao santo, tido como homem que cuidou do sofrimento humano (causado, pela peste que assolou a Europa de seu tempo) e, ao qual, é atribuída a seguinte frase: Desejo que todo aquele que invocar o meu nome fique curado e livre da peste.

No ano de 1891, no mês de dezembro, em Vitória, desembarcavam mais de mil imigrantes chegados do porto de Gênova, na Itália, vindos no navio Birmânia.

Após alguns dias na Hospedaria dos Imigrantes da Pedra d’Água (hoje penitenciária - IRS) situada na baía de Vitória, viriam para São Mateus de onde seguiriam para a região da Serra dos Aymorés (hoje Nova Venécia), onde se localizavam grandes fazendas de café, dentre elas a do coronel Matheus Gomes da Cunha, a fazenda Boa Esperança (hoje Serra de Cima) na qual a maioria deles se fixaria como diaristas ou meeiros.

Já corria o ano de 1892 quando o Governo do Estado criou o núcleo colonial Nova Venécia e colocou em sua direção o Dr. Antônio dos Santos Neves. Dentre as seções do núcleo, estava uma que se situava logo acima da sede (esta, conhecida como “Barracão”) e que fazia referência aos antigos habitantes da região, os índios da tribo Jiporok, nação Botocudo, conhecidos também por Aymorés. Era a Seção Pip-Nuk, nome que na língua borum, falada pelos índios, significa: eu não vi, e que a tradição oral registra como sendo o nome de seu último líder.

Mas o que destacamos é que no vale do rio Cricaré, no trecho conhecido por Pip-Nuk, floresceu uma das mais prósperas comunidades italianas do norte do estado, no século XIX e início do XX. E este, constitui hoje um dos sítios históricos mais importantes do município de Nova Venécia, tão importante quanto a região da APA da Pedra do Elefante.

Naquela época (1892) o Governo do Estado, dividiu o vale em lotes retangulares com área de 300.000 metros quadrados e os distribuiu a famílias de imigrantes que após algum tempo deveriam pagar suas dívidas geradas pela aquisição do lote.

Os colonos italianos pioneiros no Pip-Nuk foram àqueles chegados no navio a vapor italiano Birmânia, em dezembro de 1891 e, dentre eles, lembramos, para tirar do anonimato, as famílias: LIVIO, DELLAVEDOVA, OLIVIERI, FRIZIERO (hoje FRIGERIO), MAZARIN, ZANON, CAPELLETO, VIDOTTO, GASPARINI, BERCAVELLO, PACCAGNAN, BRAIDA, BIRAL, CEBIN, PUTTIN, CONTARATTO, FONTANA, CALATRONI, BUSATTO, MARCARINI, LAVAGNOLI, FERRUGIN, SABADINI, CHIAROTTI (hoje CHEROTTO), MESTRINELLI, SELVATICO e MILLERI.

Impossível não falar dos MILLERI, pois foi pela devoção dessa família que surgiu a capela de São Roque no Pip-Nuk, uma das mais antigas de Nova Venécia.

A família MILLERI, na época de sua chegada, era composta pelo patriarca Luigi, sua esposa AVOGARA Marianna e mais seis filhos, dentre eles, Serafino que tinha apenas cinco anos de idade quando chegou. Vinham de um lugar chamado Soave, na milenar província de Verona, pertencente à região do Vêneto, no norte da Itália.

Os MILLERI tinham um lote colonial, situado na margem direita do rio Cricaré, um pouco acima da cachoeira do Pip-Nuk onde ergueram a primeira capela de São Roque do Pip-Nuk, no ano de 1908. Compraram o sino, que ainda hoje é utilizado na capela, pela quantia de cento e cinqüenta mil réis paga ao Sr. José Valentim da Silva, representante do Dr. Arlindo Gomes Sudré, que devia ser o proprietário do mesmo, conforme recibo assinado por ele em 1º de setembro de 1908. Esse sino é centenário e, segundo alguns, teria pertencido a fazenda do Barão de Aymorés.

No ano de 1908, foi esculpida pelo imigrante italiano Celeste Rizzo, escultor que residia em Santa Leocádia, há aproximadamente 23 km de São Mateus, a imagem de São Roque, toda em madeira. Quanto à imagem de São Benedito, esta, pertencia à fazenda Boa Esperança e foi entregue aos MILLERI por Álvaro Gomes da Cunha, filho do coronel Matheus Cunha como atesta uma carta que data de 05 de março de 1909.


Detalhe do altar da capela de São Roque do Pip-Nuk. Além da típica escultura de São Roque feita em madeira pelo imigrante Celeste Rizzo, em 1908, existem outras como a de São Benedito, também centenária, que pertenceu a capela da Fazenda Boa Esperança do Coronel Matheus Cunha e que foi doada pelo filho deste, Álvaro, em 1909 para capela dos Milleri. Imagens de Nossa Senhora e do próprio Cristo, estas bem mais recentes, também fazem parte do acervo da capela que, desde os anos 1960, encontra-se na propriedade da família de Augusto Frigerio. Foto: Rogério Frigerio Piva, 1998.

È provável que antes de 1908, já houvesse algum capitello, uma espécie de oratório, como era o costume. Sabe-se que no caso da Capela de São Sebastião, situada mais acima e contemporânea a São Roque Pip-Nuk, o capitello existiu. Quanto à capela de Santa Rita, já no Alto Pip-Nuk, esta é de construção bem mais recente.

O Sr. Serafino MILLERI foi quem tomou a frente e cuidou da capela que estava construída próxima à residência da família, próxima a margem sul do rio Cricaré.

Os padres Carlo Regattieri e Francisco Traverso constam como os primeiros a assistir a capela, nos primeiros anos. Depois outros vieram e a própria capela serviu de escola.

As festas anuais e as procissões faziam todo o povo se reunir, mesmo os que não residiam no Pip-Nuk. Na década de 1920 chegaram a fazer uma procissão onde trouxeram a imagem de Santo Antônio do Córrego da Serra para o Pip-Nuk e levaram a de São Roque para o Córrego da Serra, tudo por causa da estiagem.

Milagre ou não, o fato é que as preces foram respondidas com muita chuva e uma enchente que destruiu parte da ponte velha (hoje no centro da cidade) que tinha acabado de ser construída.
Não só italianos, mas também brasileiros como as famílias: FARIAS, ELIAS, LIMA, CAYRU e SÁ (perdoem as omissões) freqüentaram São Roque.

Como o tempo, a primitiva capela foi substituída por outra, mais distante da margem do rio, devido à erosão, mas ainda no lote dos MILLERI.

Enquanto o Sr. Serafino viveu no Pip-Nuk, a capela permaneceu na propriedade dos MILLERI, mas como a vila e posterior cidade de Nova Venécia, começava a desenvolver-se, ele mudou para lá, o que fez com que a capela fosse transferida, por volta de 1961, para o outro lado do rio, na propriedade dos FRIGERIO, em local próximo à cachoeira do Pip-Nuk. Também esta terceira capela teve vida curta e foi transferida para o local onde se encontra até os dias de hoje (2009), ainda na propriedade da família de Augusto Frigerio.

Durante as décadas de 1960 e 1970 o êxodo rural esvaziou o vale da presença de inúmeras famílias que, a exemplo do Sr. Serafino foram para cidade, para outros municípios ou mesmo estados.

Mas a família FRIGERIO, como herdeira dessas relíquias religiosas, conseguiu permanecer no Pip-Nuk, no mesmo lote que o patriarca Giuseppe FRIZIERO escolhera, em 1910, para viver e onde, em 1929, construiu a sua residência, raro exemplar da arquitetura italiana produzida pelos imigrantes no Pip-Nuk.

Todos esses marcos são representativos da cultura e religiosidade em Nova Venécia, que, como em outras regiões, é marcada pela simplicidade e rusticidade popular, verdadeiro exemplo de devoção cristã.


NOTA: Outra versão do presente artigo foi publicada com o título “A Religiosidade Popular no Canaã Veneciano” no jornal “Folha do Estado” em 05/10/2002.


*Rogério Frigerio Piva é natural de Nova Venécia. Historiador graduado pela Universidade Federal do Espírito Santo. Pesquisa sobre a História de Nova Venécia desde 1992. Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. Trabalhou por 10 anos no Arquivo Público do Estado do Espírito Santo onde ocupou diversos cargos. Atualmente é Professor de História e Filosofia do Centro Educacional Evolução.

sábado, 1 de agosto de 2009

Vale do Pip-Nuk, o “Canaã Veneciano”: Vestígios de uma saga de 117 anos (1892-2009).

Cartão Postal confeccionado para a campanha “S.O.S. Pip-Nuk”, articulada pelos moradores da região. A Cachoeira de São Roque do Pip-Nuk, como é mais conhecida, é um Patrimônio Natural de Nova Venécia que quase desapareceu, devido à proposta de construção de uma barragem no rio Cricaré. Foto: Idáulio Bonomo [?], 2002.


Por Rogério Frigerio Piva*


Em 2002 comemoramos o centenário de publicação do romance “Canaã” do escritor Graça Aranha. Esta obra, referência da literatura brasileira do início do século XX, fala sobre os sonhos e esperanças dos imigrantes alemães em terras capixabas, tendo como cenário, o município de Santa Leopoldina, além de Santa Teresa, do vale do Rio Doce e arredores.

Todo o Espírito Santo foi rico em “canaãs” entre o final do século XIX e meados do século XX. No antigo município de São Mateus, o nosso “Vale do Canaã”, tinha outro nome, mas era povoado das mesmas esperanças. Era o “Pip-Nuk”, um trecho do vale do braço Sul do Rio São Mateus ou rio Cricaré, situado atualmente no município de Nova Venécia.

Há muito tempo, antes da chegada dos colonizadores europeus, essa região, já era habitada por índios da nação dos botocudo, a tribo dos Jiporok, que também eram conhecidos como Aymoré ou mesmo Pip-Nuk que, segundo alguns, seria o nome do último grande capitão (= líder) que estes possuíram antes de serem extintos no início do século XX. De sua passagem pela região restaram apenas os vestígios arqueológicos ainda por serem explorados e, até mesmo, a referência dos mais antigos a locais próximos a São Roque de Pip-Nuk, onde arranchavam, pois, sendo caçadores/coletores nômades, viviam se deslocando nas margens do rio Cricaré.

A referência aos Pip-Nuk, se preservou, mesmo com a chegada dos colonizadores. Depois deste breve esclarecimento, passemos para etapa seguinte dessa História, que começou no Reino da Itália, por volta do ano de 1891, quando, no dia 19 de Novembro, mais de mil imigrantes, no porto da cidade de Gênova, embarcaram no navio a vapor “Birmânia”, com destino ao porto de Vitória, capital do Estado do Espírito Santo.

Após mais de vinte dias sobre o oceano Atlântico, desembarcaram na Hospedaria de Imigrantes da Pedra d’Água (onde hoje funciona o Instituto de Reabilitação Social – IRS), na baía de Vitória, no dia 10 de dezembro. Permaneceram na Hospedaria até os dias 15 e 30, quando as famílias de imigrantes italianos, destinadas aos núcleos coloniais de Santa Cruz e São Mateus, foram divididas em dois grupos, respectivamente, embarcados nos navios costeiros de bandeira brasileira, de nomes “Lúcia” e “Mayrink”, com destino ao porto da cidade de São Mateus.

Ao chegarem, algumas famílias se destinaram no núcleo colonial de Santa Leocádia, mas, a maioria, rumou para as fazendas da região da Serra dos Aymorés (atual Nova Venécia), principalmente para a fazenda da Boa Esperança (atual Serra de Cima), propriedade do Coronel e Comendador Matheus Gomes da Cunha, irmão do Barão de Aymorés. Provavelmente, chegaram no mês de janeiro do ano de 1892.

Nesta época, o Governo Estadual criou o Núcleo Colonial de Nova Venécia, a cargo do Dr. Antônio dos Santos Neves, que foi o Diretor responsável pela demarcação dos lotes, fatiados às margens do rio Cricaré, desde abaixo da atual cidade de Nova Venécia até a região conhecida por Boa Vista, bem acima do Pip-Nuk. Eram lotes com área de 300 mil metros quadrados, em plena mata virgem.

Para alcançar seus lotes, é possível que estas famílias tenham passado pelo córrego Boa Esperança, que, nessa época, já contava com alguns colonos brasileiros, sobretudo cearenses, como as famílias: ELIAS, LIMA, LOURENÇO e FIRMINO DA COSTA, dentre muitas outras. Por ali, os italianos alcançaram as margens do Cricaré, e foram habitar nos lotes daquela que ficou conhecida como “Seção de Pip-Nuk” do Núcleo Nova Venécia.

Ali viveram seus sonhos e suas tragédias, pois muitos pereceram naqueles primeiros anos, mas os sobreviventes fundaram a maior comunidade de italianos do município de São Mateus.

Dentre estes colonos pioneiros, que vinham, em sua maioria, das províncias de Pádova, Verona e Treviso, lembramos: LIVIO Giovanni, DELLAVEDOVA Pietro, MILLERI Luigi, OLIVIERI Eugenio, FRIZIERO Luigi, MAZARIN Dario, ZANON Antonio, CAPELLETO Francesco, VIDOTTO Luigi, GASPARINI Natale, BERCAVELLO Beniamino, PACCAGNAN Pietro, BRAIDA Giulio, BIRAL Antonio, CEBIN Marco, PUTTIN Giovanni, CONTARATTO Angelo, FONTANA Giuseppe, CALATRONI Angelo, BUSATTO Antonio, MARCARINI Andrea, LAVAGNOLI Lodovico, FERRUGIN Francesco, SABADINI Luigi, CHIAROTTI Pasquale, MESTRINELLI Francesco, SELVATICO Luigi, dentre outros, todos com suas respectivas famílias.

No ano de 1893, vindos de Vitória no navio “Bento Gonçalves” chegaram os “napolitanos” representados pelas famílias CEGLIA (hoje SELIA) e TAGLIAFERRO. E por fim, em 1894, também chegados no porto de São Mateus pelo navio “Lucia”, os “lombardos”: ROSA Pietro, PANZERI Giovanni e seu irmão PANZERI Silvestre, FRIGERIO Antonio, AIROLDI Giosuè, REDAELLI Caetano, também com suas famílias. Lembramos que, mais tarde, outros imigrantes italianos e migrantes brasileiros se deslocaram para o Pip-Nuk.

No início do século XX, as terras de Pip-Nuk foram consideradas as melhores e mais produtivas, pelo enviado do cônsul italiano da época, Sr. Rizzeto, que calculou cerca de 200 famílias habitando o Pip-Nuk (todas italianas), mais do que em qualquer outro lugar, em todo o antigo município de São Mateus.

Também, nesta época, migrantes de Minas Gerais também se estabeleceram ali como: Clarindo Pacheco Rolim, Francisco Luiz de Sá e Manoel Ferreira da Rocha.

Segundo o nosso saudoso Pe. Carlos Furbetta, em seu livro “História da Paróquia de Nova Venécia”, publicado em 1981, a primeira capela construída pelos imigrantes em Pip-Nuk, foi a de São Sebastião, que existia, primitivamente, na margem sul do rio, próximo do morro onde, no cume, ainda hoje, se encontram os vestígios do centenário “Cemitério de São Sebastião do Pip-Nuk”, local de repouso dos restos mortais de muitos patriarcas e matriarcas venecianos, e onde, no passado, existiu a sede da Seção do Pip-Nuk, terreno que hoje pertence a um descendente do imigrante Silvestre PANZERI. O Padre Furbetta, calculou que São Sebastião fosse do ano de 1917, mas documentos comprovam que a capela de São Roque, atualmente na propriedade do Sr. Augusto Frigerio, na margem norte do rio, seria de devoção mais antiga, pois, somente a imagem de São Roque, esculpida pelo imigrante Celeste Rizzo, que residia em Santa Leocádia, remonta ao ano de 1908.

A primeira capela de São Roque foi construída na margem sul do rio, no antigo lote da família MILLERI, que também adquiriu o secular sino dos fazendeiros da Serra dos Aymorés e recebeu a guarda da imagem de São Benedito, que pertencia a Álvaro Cunha, filho do cel. Matheus Gomes da Cunha.

Hoje, a capela, em sua quarta edificação, localiza-se na propriedade do Sr. Augusto Frigerio, nas proximidades da casa construída, no ano de 1929, por seu pai, o italiano - natural da comuna de Abano Terme, na província de Pádova - Giuseppe FRIZIERO (hoje Frigerio). A casa é um dos últimos exemplares de arquitetura italiana feita no Pip-Nuk, por esses italianos que lá se estabeleceram no início da década de 1890.

Vista panorâmica da região de São Roque do Pip-Nuk, tendo ao centro a antiga residência da família FRIGERIO, construída em 1929, pelo patriarca italiano Giuseppe Friziero, um dos últimos exemplares da típica arquitetura rural feita por imigrantes italianos em Nova Venécia. Foto: Rogério Frigerio Piva, 2002.
A antiga residência compõe com a capela de São Roque, a cachoeira no rio Cricaré e o vale, um cenário de rara beleza, que esteve prestes a desaparecer devido à ameaça de uma barragem, que iria colocar um importante sítio histórico do município de Nova Venécia, de baixo d’água, devido a um convênio entre a Prefeitura Municipal e a CESAN no ano de 2002.

Um patrimônio natural e cultural veneciano que esteve prestes a ser destruído, ou melhor, sepultado pelas águas, o que, felizmente, não se concretizou graças à articulação dos moradores que se mostraram contrários à "forma" como a obra estava sendo encaminhada.


NOTA: Outra versão do presente artigo foi publicada com o título “Canaã veneciano ameaçado pelas águas: Construção de barragem poderá submergir o remanescente histórico de uma saga de 110 anos (1892-2002)” no jornal “Folha do Estado” em 10/08/2002.


*Rogério Frigerio Piva é natural de Nova Venécia. Historiador graduado pela Universidade Federal do Espírito Santo. Pesquisa sobre a História de Nova Venécia desde 1992. Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. Trabalhou por 10 anos no Arquivo Público do Estado do Espírito Santo onde ocupou diversos cargos. Atualmente é Professor de História e Filosofia do Centro Educacional Evolução.

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